Comida de verdade, sem pesar no bolso.

Em meados de janeiro, a Marília escreveu um artigo, que é o cerne do que vimos discutindo nos bastidores há algum tempo.

O assunto é recorrente na paleosfera (tem este artigo bem ilustrado) e de maneira geral, é uma pergunta que qualquer um que faz uma “dieta estranha” volta e meia escuta.

Este artigo, apesar de longo (é o maior que já escrevi aqui), está longe de esgotar o assunto. Estou tentando apenas mostrar algumas alternativas.

Meu depoimento é bem simples: em casa (dois adultos que trabalham fora), não aumentamos a despesa mensal. No entanto, comemos comida mais gostosa e acrescentamos alguns ingredientes mais caros, já que estamos comprando mais queijos importados e mais vinhos.

Nós amamos ovos!

Nós amamos ovos!

Adeus pãozinho, olá ovos mexidos.

Essa foi uma coisa que minha esposa comentou um dia: “Digamos que um casal com quatro filhos compre 8 pães por dia. São 400g de pão, a R$ 11,00 o quilo, são R$4,40 diariamente.”

Uma dúzia de ovos custa em torno de R$ 3,80 aqui por perto. Faz seis omeletes de bom tamanho.

Ovo, além de ser uma das melhores fontes de proteína (é considerado uma proteína de referência, pois contém os aminoácidos essenciais em maior concentração), contém colina, ferro e outras coisinhas importantíssimas para os olhos e cérebro das crianças. Além disso, ovos se preservam por muito mais tempo que o pãozinho. Alguém já ouviu falar em ovo amanhecido?

Ovos são também bastante portáteis quando cozidos, sendo portanto uma boa opção de lanche. Ovos se preservam relativamente bem em temperatura ambiente, ao contrário da carne (que dirá frango e peixe). Considerando que o preço por kg da proteína (uma dúzia de ovos pesa de 500 a 700g) é mais ou menos igual para os ovos e a carne de segunda, a preservação dá vantagem para o ovo.

Sabe aquela barrinha de cereal? Ela tem 100kcal. Um ovo tem 70. A barrinha é só carboidrato e açúcar (outro carboidrato), de alto índice glicêmico. Em outras palavras, além de não matar a fome, vai te dar fome de novo daqui a pouco. O ovo tem proteína e gordura (boa), e vai te deixar sem fome por mais tempo. Dois a zero para o ovo.

Rabada, costela e mocotó

As carnes de segunda, especialmente esses cortes considerados inferiores, normalmente são encontrados a menos de R$10,00 por quilo.

Tem um porém…Ossobuco é um prato tradicional da culinária italiana. Vai ser difícil achar uma Trattoria que sirva um prato de ossobuco a menos de R$50 por pessoa….

Carne de segunda?

Carne de segunda?

Quem considera rabada um corte inferior com certeza nunca comeu uma rabada que valha o nome. Na rabada temos além da carne macia, gordura boa, cartilagem (fonte de colágeno) e tutano (mais colágeno), uma penca de vitaminas e todos os temperos necessários. É, na hora da comida de verdade, não se pode desprezar o tempero de verdade, que além de acrescentar cor e sabor, também acrescentam alguns nutrientes que são difíceis de encontrar em outras fontes.

Mocotó e Rabada

Quem nunca comeu uma vaca atolada? O cozido de costela com mandioca, cheio de temperos? Nem só de churrasco vive a costela.

A primeira vez que vi, achei estranho. Afinal, criado só com comidinha bonitinha, nunca tinha visto um prato rústico. Aliás, como comentei com a Marília no outro dia: tem alguns pratos que quanto mais rústicos, mais saborosos. Fogão a lenha e panela de ferro, alguém?

Já o mocotó, descobri durante o pós-operatório de uma reconstrução ligamentar no joelho. Estava genuinamente preocupado em aumentar a disponibilidade de colágeno, para acelerar a recuperação. Coisa mais simples. Receita da sogra. Lave o pé do bixo com água, depois esfregue um limão (ou mais) e deixe nesse molho de água com limão durante a noite. No dia seguinte, adicione os temperos (ou não) e cozinhe até desmanchar tudo, adicionando água para não queimar. Quando só restarem os ossos, despreze-os e ferva até reduzir. Deixe esfriar. O cozido vai se separar em 3 fases: duas de gordura (despreze ou faça sabão) e a gelatina, que é o que queremos. Use para engrossar caldos ou sopas ou coma assim. Tem receitas de mocotó aqui, aqui e aqui.

Salmão e sardinha

O salmão é uma excelente fonte de ômega-3, um dos ácidos graxos essenciais. Pelo menos é isso que todo mundo acha.

É verdade.

Se você for um urso.

No Alaska.

Acho que não é o caso.

A maior parte (quase todo) o salmão que comemos é criado em fazendas. Alimentado com ração a base de cereais. Peixes, na natureza, não comem cereais. Comem plantas ou outros animais. O salmão criado com cereais tem muito mais ômega-6 em sua gordura. Esse ácido graxo está altamente implicado na formação daquelas placas que entopem as suas veias, causando várias doenças  como tromboses, acidentes vasculares coronarianos (infarto), encefálicos (derrames). De acordo com algumas publicações que começam a surgir, os ômega-6 também estão associados a algumas doenças degenarativas, como Parkinson e Alzheimer.

Solução: coma sardinha.

Hortaliças

Já foi a alguma feira livre, no momento em que os feirantes terminam de carregar os caminhões, para ir embora? Já reparou na quantidade e tamanho das pilhas de hortaliças desprezadas?

Sim, como diz um amigo meu, é uma das maiores fontes de desperdício de comida que existe. (Mais ou menos, vou discutir isso em outro artigo). A maior parte desse material é desprezado por critérios estéticos: as hortaliças estão feias. Acontece de ter alguma coisa estragada também, mas a maioria é simplesmente porque estão feias.

Já vi algumas pessoas pegarem maços de folhas de couve-flor de graça! A folha da couve flor (ou brócoli), retirando os talos, pode ser preparada como a couve-manteiga. Os talos podem usados em caldos (como o de costela ou mocotó), para adicionar sabor e nutrição. Sim, fazemos isso em casa. Pedimos para o feirante uma couve-flor com as folhas.

Para chegar ao meu trabalho, passo pelo Mercado Municipal. No final da madrugada há grande movimento dos comerciantes de frutas e hortaliças. Normalmente, quando passo as equipes de limpeza pública já estão limpando e lavando a área. Dia desses, ví um (suponho) morador de rua andando com duas grandes mangas, bem vistosas. Pelo jeito estavam muito cheirosas, pois o rapaz não parava de cheirá-las.

A famosa hora da xêpa (o final da feira) é a hora em que se encontram os menores preços, algumas vezes 50% mais baixos do que durante o “expediente” normal. Muita coisa que está apenas feia, ou muito madura é vendida baratíssimo ou dada.
Tomates bem maduros, desprezando as sementes e partes passadas, dão bons molhos. É possível fazer o  extrato em casa mesmo, basta um pouco de paciência: bater no liquidificador (ou espremer), passar na peneira e desprezar peles e sementes e ferver até evaporar toda a água. Vai ficar um vermelho muito mais bonito que aquele do elefantinho colorido.

À guisa de conclusão

Com um pouco de informação é possível fazer escolhas nutricionais sábias e saudáveis. Acima de tudo econômicas. Seu bolso agradece duas vezes: a primeira ao economizar para se alimentar, a segunda ao precisar de menos remédios. Como disse Hipócrates, o pai da medicina, há mais de  dois mil anos: “Que tua comida seja teu remédio. Teu remédio, tua comida”.

Pergunta Final (e a resposta)

Afinal, porquê cargas d’água, a cesta básica não contém ovos (umas 4 dúzias), manteiga (1kg), leite, queijo, costela, rabo, canela de boi, hortaliças?

Simples. Essas coisas estragam e/ou precisam de refrigeração. Isso não é nem um pouco bom para as empresas que montam as tais “cestas básicas”. Essas empresas são basicamente grandes galpões onde entram caixas e caixas de produtos alimentícios industrializados, que são simplesmente reacondicionados em outras caixas que saem pela outra porta.

Só.

Sobre Paulo Marcondes

Geólogo, Mestre em Ciências e Engenharia de Petróleo, Professor. Estudante dos estilos de vida e tradições nutricionais ancestrais. Praticante e instrutor de Kali Silat (STW) e Kombato, amante do ar livre, proto-radioamador, proto-jipeiro, proto-gyrevik, powerlifter-wanabe, e chato nas horas vagas. Ver todos os artigos de Paulo Marcondes

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